Sigilo Profissional e a Denúncia

Joana Freire Azevedo, Advogada

A propósito do recente celeuma sobre o encobrimento de abusos sexuais pela Igreja Católica, o Senhor Presidente da República veio fazer um apelo à utilização dos canais de denúncia, pelas vítimas ou por quem tenha conhecimento de tais abusos.

Em que posição ficam os profissionais, também sujeitos ao dever de sigilo, que acompanham estas vítimas?

O sigilo ou segredo profissional é a postura adotada pelo profissional de manter a confidencialidade de informações referentes a pessoas ou organizações que tenham sido adquiridas em função do exercício da sua profissão.


No especifico caso dos psicólogos, o Código Deontológico dos Psicólogos Portugueses determina que,

" ...os/as psicólogos/as têm a obrigação de assegurar a manutenção da privacidade e confidencialidade de toda a informação a respeito do seu cliente, obtida direta ou indiretamente, incluindo a existência da própria relação, e de conhecer as situações específicas em que a confidencialidade apresenta algumas limitações éticas ou legais"[1].


Já o dever de denúncia encontra-se legalmente fixado[2] para todos os profissionais que possam sem considerados funcionários, em suma:

  • entidades policiais, quanto a todos os crimes de que tomarem conhecimento;

  • funcionários públicos, quanto a crimes de que tomarem conhecimento no exercício das suas funções e por causa delas;

  • qualquer pessoa que tenha sido chamada a desempenhar ou a participar no desempenho de uma atividade compreendida na função pública administrativa ou jurisdicional, ou, nas mesmas circunstâncias, desempenhar funções em organismos de utilidade pública ou nelas participar.

Assim, quando um psicólogo não estiver a exercer as suas funções junto de estabelecimento/entidade/organismo de natureza pública, não se encontra, por princípio, sujeito ao dever de denúncia.

Além disso, e também por princípio, vêm os tribunais superiores decidindo que o dever de segredo profissional deve prevalecer sobre o dever de denúncia obrigatória.


[1] Princípio específico 2, Privacidade e Confidencialidade.

[2] Artigo 242º do Código do Processo Penal.

Assim não sucederá, porém, em TRÊS circunstâncias:

  1. quando o profissional obtenha o consentimento da vítima para a denúncia;

  2. quando as vítimas sejam menores, idosos, deficientes, incapazes ou pessoas particularmente indefesas; ou

  3. quando se esteja perante casos extremados, em que a intensidade ou reiteração sejam evidentes e as vítimas se encontrem numa posição de tão grande fragilidade que se conclua pela inexistência de incapacidade própria para a denúncia.

Nestas situações, que devem ser objeto de avaliação e fundamentação prévia pelo psicólogo, o dever de denúncia prevalecerá sobre o dever de sigilo, pois na ponderação dos dois interesses em causa evidenciar-se-á a especial necessidade de defesa da dignidade e integridade da pessoa que por si não se encontre em condições de levar a cabo a denúncia.


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Joana Freire Azevedo, Advogada / PTSD Center www.ptsd-center.com